Cenário de juros baixos e economia brasileira sem tanta força corroboram ambiente de dólar em alta; com isso, real não deve encontrar forças para subir
Lara Rizério, Infomoney
Sendo dia de ânimo ou de aversão ao risco nos mercados mundiais, o dólar segue batendo sessão após sessão recorde em termos nominais, mostrando que a alta da moeda americana veio mesmo para ficar. Nesta quarta-feira, 12, o dólar comercial superou os R$ 4,35, renovando máxima histórica intradiária, após encerrar a última terça-feira em um novo recorde de fechamento a R$ 4,3269.
Com isso, apenas em 2020, a valorização da moeda ultrapassa os 8% – e a expectativa de analistas e economistas é de que o real ainda não vai encontrar forças para subir. Pelo contrário, o dólar pode se valorizar ainda mais.
O Credit Suisse, que na semana passada apontou que o dólar poderia chegar a R$ 4,30 com dados fracos da economia nacional e reflexo do coronavírus, apontou em novo relatório que a moeda americana pode ser negociada entre o intervalo de R$ 4,25 e R$ 4,45 no curto prazo.
Alvise Marino, estrategista do banco suíço, destaca como principal motivo para esta visão o ganho com carry trade (combinação entre fazer uma posição vendida em moeda com taxa de juros mais baixa e outra comprada em moeda com juro mais alto) cada vez menor no Brasil, uma vez que as taxas de juros no país estão historicamente baixas.
Além disso, aponta, há uma forte percepção entre os investidores, observada através do posicionamento dos investidores no mercado de câmbio, de que o Banco Central irá interferir no mercado caso o dólar atinja novos picos. Contudo, o Credit tem uma visão cautelosa sobre possíveis intervenções da autoridade monetária, percepção esta compartilhada pelo Morgan Stanley.
“Apesar do dólar estar nas máximas históricas, a probabilidade do BC entrar em ação permanece baixa”, apontam os estrategistas do Morgan, enquanto as expectativas de inflação permanecem baixas. O último Focus, divulgado na segunda-feira, reduziu de forma expressiva e pela sexta semana seguida a projeção para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para 2020, passando de 3,40% para 3,25%. “A sinalização das autoridades sugere que eles estão confortáveis com o dólar nos níveis atuais”, complementa a equipe do banco.
A última vez que o BC atuou mais fortemente foi em novembro de 2019. Na ocasião, o BC fez leilão de dólar em duas ocasiões apenas no dia 26 daquele mês, com a justificativa de que o real estava disfuncional e descolado de outras moedas. As intervenções se seguiram e, no dia 28, houve leilão à vista de US$ 1 bilhão, que ajudou a impulsionar a cotação do real em mais de 1% nas negociações intradiárias. Porém, por enquanto, os economistas não esperam uma atuação desta magnitude, uma vez que ela ocorreu, segundo a própria autoridade monetária, por conta da forte volatilidade da moeda.
Há chances de o dólar voltar a cair?
Para o Credit, o que poderia fazer com que o dólar perdesse força no curto prazo, sendo negociado por volta do R$ 4,25, seria a mudança do discurso do Comitê de Política Monetária (Copom). Na avaliação do banco, apesar de ter cortado a Selic de 4,5% para 4,25% em reunião do último dia 5 de fevereiro, o Comitê indiciou menor flexibilidade na política monetária e fez com que os investidores interpretassem a mensagem como um fim do ciclo de cortes. A princípio, isso poderia levar a uma alta do real, já que os ganhos com carry trade, ainda que baixos, não diminuíram ainda mais.
Porém, com uma ata da reunião que ampliou os questionamentos sobre se o fim do ciclo realmente ocorrerá ou se há uma porta aberta para novos cortes, seguindo-se dos dados do IPCA de janeiro na sexta, 7, e de vendas no varejo abaixo do esperado na quarta, 12, o real não encontra forças para subir. Nesse dia, por exemplo, a moeda brasileira chegou a registrar o quarto pior desempenho entre os emergentes, mesmo com o alívio no exterior por conta dos menores temores sobre o coronavírus.
“O IPCA e vendas no varejo não permitiram a retirada total de apostas de novo corte da Selic este ano e este é um dos fatores que ajuda a manter o dólar em alta”, avalia o diretor da Wagner Investimentos, José Faria Júnior, que segue com o alerta da possibilidade da moeda americana se aproximar dos R$ 4,40.
Para Faria, o real está proporcionalmente mais fraco na comparação com outras diversas moedas também por conta da ausência de maior fluxo para o país e pela fraqueza das commodities (com as cotações do petróleo e do minério de ferro sendo especialmente impactadas com o surto de coronavírus). “Assim, uma recuperação das commodities com algum fluxo adicional poderiam ser motivadores da queda do dólar”, avalia. No médio e no longo prazo, contudo, a tendência segue de alta para a moeda americana.
Além disso, Matheus Soares, analista da Rico Investimentos, ressalta em relatório que o fluxo de estrangeiro poderia voltar sem os juros altos caso o Brasil mostre forças para voltar a crescer. Desta forma, os últimos dados fracos da economia não ajudam na entrada do investidor de fora. “O mercado espera uma alta de 2,3% [do PIB] neste ano e 2,5% em 2021. O problema é que nos últimos anos o crescimento não veio como o esperado, e como o estrangeiro tem mais alternativas além do Brasil, ele só virá para cá quando a economia crescer consistentemente”, afirma.
Enquanto isso, nos EUA, os dados de serviço e de indústria surpreenderam positivamente as estimativas do mercado, enquanto a temporada de resultados também aponta para um ambiente econômico saudável: quase 80% das empresas listadas no S&P500 reportaram seus números, sendo que cerca de 60% delas superaram o consenso de lucro.