Mercado usa bloqueio de negociação para evitar riscos

São Paulo – Lock-up, do inglês trancar, é a nova arma do mercado para proteger empresas da especulação de investidores. Presente nos prospectos, a cláusula agora é usada para o investidor pessoa física, como no caso da IPO (oferta pública inicial de ações, na sigla em inglês) do banco BMG de ontem.

A cláusula obriga o comprador a manter o papel por um período mínimo antes de vendê-lo – 45 dias, por exemplo.

Com juros baixos e Bolsa batendo recordes, os pequenos investidores migram e intensificam seus aportes em renda variável, incluindo IPOs e follow-ons (oferta adicional de ações). O que parece positivo para o desenvolvimento do mercado também oferece um risco para as companhias.

Estima-se que metade das pessoas físicas que entram nestas ofertas pratica a flipagem, ou seja, vendem os papéis adquiridos logo no primeiro pregão de negociação. O movimento causa pressão que pode derrubar a cotação do papel logo na estreia.

Com a distribuição obrigatória de, no mínimo, 10% da oferta para pessoas físicas, o caminho encontrado para bloquear este movimento foi a ampliação do uso do lock-up.

Coordenadores de ofertas determinaram que a alocação de ações com essa cláusula seria prioritária. Ou seja, a venda de ações com ‘trava’ teria preferência às ações ‘sem trava’ na distribuição para os pequenos investidores.

A cobaia foi a Petrobras, com o follow-on das ações que estavam com a Caixa Econômica. Na oferta pública, 2% do total de ações foi vendida com lock-up de 45 dias.

Apesar de Caixa e Petrobras afirmarem que houve forte demanda de pessoas físicas, os interessados não preencheram toda a cota disponibilizada, de 24%; acabaram levando só 20,3% do total da oferta.

No caso do Banco do Brasil, o cenário foi diferente. Pessoas físicas ofertaram R$ 7 bilhões pelas novas ações colocadas em mercado, valor superior ao total arrecadado pelo follow-on (R$ 5,8 bilhões).

Como a demanda foi alta, o banco conseguiu destinar todas as ações reservadas ao varejo (pessoas físicas com investimento até R$ 1 milhão) a ações com lock-up. Quem comprou uma ação no follow-on do BB terá que esperar 45 dias para vendê-la.

Depois do sucesso no uso da cláusula em follow-ons, foi a vez de um IPO. Na abertura de capital da rede de joias Vivara, 8% do total de ações vendidas têm a ‘trava’. A diferença, nesse caso, é o tempo: dos 13% destinados ao varejo, 5% foram ações normais, sem lock-up. As demais foram divididas em lock-up de 45 dias (5%) e lock-up de 120 dias (3%).

Os organizadores fizeram a divisão para evitar uma grande oscilação tanto no IPO, quanto no vencimento do lock-up.

Nas redes sociais, investidores se mostraram frustrados e confusos ao conseguir arrematar poucas ações. “Não entendi essa da Vivara. Fiz uma reserva de 5 mil ações e me reservaram 6 ações apenas??? Nunca vi uma reserva tão baixa”, comentou um internauta.

Para participantes do mercado, o modelo será regra no futuro. Quanto mais atenuado o risco pessoa-física, mais chances de sucesso na oferta.

No entanto, segundo a professora de Finanças do Insper, Andrea Minardi, o lock-up só funciona se houver grande demanda de pessoas físicas, como no caso da Vivara. A rede de joias tinha interesse na participação destes investidores e promoveu ações de marketing em torno do seu IPO. “O investidor não vai querer o lock-up em ofertas pouco procuradas, de empresas menores”, afirma Minardi.

BMG – No IPO do BMG, de menor magnitude (R$ 1,39 bilhão), o uso de lock-up foi mais tímido: 3,08% do total das ações com prazo único de 45 dias.

Para a especialista, a cláusula é benéfica para o mercado. “Se a flipagem é muito grande, o preço no IPO cai demais e o investidor pessoa física perde dinheiro. Com essa regra, há mais chances de estabilidade no papel.” Ela não recomenda a flipagem, pelo alto risco da operação, e aponta que não se deve pensar o investimento em renda variável no curto prazo.

Rafael Passos, analista da Guide Investimentos, também vê o emprego do lock-up como positivo. “Os coordenadores da oferta não querem especuladores que vendem ações no primeiro dia de negociação. Eles querem investidores com interesse em se posicionar na empresa. Quanto mais participação do varejo, geralmente, pior o IPO”.

Ele diz que a cláusula não deve desencorajar a participação em ofertas de ações. “Se é uma empresa que o investidor avaliou, gosta e acredita, melhor entrar no lock-up para conseguir garimpar mais ações”.

Fonte: Diário do Comércio

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